Como na fábula de Esopo “o problema de um é problema de todos”




Como na fábula de Esopo “o problema de um é problema de todos”


Por Alessandra Leles Rocha


Nova cepa de Coronavírus na China 1. Fasceíte necrosante em detentos de uma Penitenciária, em Boa Vista, Roraima 2. Ministério da Saúde brasileiro prevê surto de Dengue em 11 estados da Federação este ano 3. Leste da Austrália entre enchentes e incêndios 4. Moradores do Rio de Janeiro sofrem com contaminação de água 5. Chuvas intensas e volumosas atingem os estados de Minas Gerais, Espírito Santo e Rio de Janeiro 6. Isso é só uma amostra da reflexão que se deve fazer sobre a invisibilidade de certas questões ao nosso redor.
Não, não há problema perto ou problema longe de nós; há problema. Esse é o primeiro aspecto que o ser humano precisa se conscientizar. Especialmente diante desses exemplos, cujo cerne está diretamente ligado à saúde pública.
Ainda que não nos demos conta, ou optamos por não fazê-lo, a verdade é que nós seres humanos disputamos palmo a palmo os centímetros desse planeta com milhões de outras espécies, incluindo microrganismos patogênicos, ou seja, vírus, bactérias, protozoários, fungos e helmintos (vermes parasitas).
Seja pela água, ar, alimentos contaminados, contato direto com pessoas infectadas e/ou doentes, o fato é que não há como nos manter totalmente afastados desses agentes e, nem tampouco, há tratamento 100% eficaz para todos eles. Essa realidade nos coloca, então, em uma posição de vulnerabilidade muito grande.
Em condições plenas de saúde, gozando de um funcionamento perfeito do organismo, o ser humano muitas vezes consegue surpreender positivamente diante de uma patologia. Mas, a questão é que poucos, muito poucos, são privilegiados nesse sentido.
A grande maioria da população, na atualidade, vive sob os constantes impactos do stress, da poluição em diferentes níveis e tipos, do sedentarismo, do tabagismo etc.etc.etc., que inevitavelmente comprometem o equilíbrio fisiológico do corpo.
De modo que, com ou sem tratamentos disponíveis para inúmeros agentes patogênicos, diante de uma condição clinica pouco favorável, o melhor seria evitar o contato. Mas, como? Essa é a pergunta que não quer calar.
AR, ÁGUA, ABRIGO e ALIMENTO. Esses são os As que caracterizam as principais demandas humanas, no que diz respeito à sua sobrevivência. Ao mesmo tempo, são os locais preferidos para a sobrevivência dos microrganismos. Eles podem, portanto, estar no ar, na água, nos alimentos ou em fômites que significa qualquer objeto inanimado ou substância capaz de absorver, reter e transportar organismos contagiantes ou infecciosos de um indivíduo a outro, tais como, sapatos, toalhas, roupas íntimas, maçanetas, corrimãos, objetos de higiene pessoal.
É preciso pensar que o ser humano vive, basicamente, em espaços geográficos com grandes aglomerações. Quando acontece uma catástrofe natural ou uma ação antrópica indesejada 7 que expõe o ser humano a um bombardeio maciço desses microrganismos, a situação foge ao controle. No caso de uma exposição à enchente, por exemplo, doenças como a Leptospirose (bactéria Leptospira interrogans), Hepatite A e E (vírus da Hepatite), Febre Tifoide (bactéria Salmonella typhi), Cólera (bactéria Vibrio cholerae), Dengue (vírus), Zika (vírus), Chikungunya (vírus), são as mais recorrentes 8. Se tratá-las individualmente já vem sendo desafiador, imagine só, em conjunto.
Mas, não bastasse isso, algumas situações emergenciais e de alto impacto negativo ao ser humano trazem à tona, também, outros contaminantes de risco. Na situação da contaminação da água no Rio de Janeiro, por exemplo, mais do que a necessidade de ser inodora, incolor e insípida é preciso que seja totalmente livre daquilo que é invisível, ou seja, hidrocarbonetos, resíduos de medicamentos, sabões e detergentes, efluentes industriais diversos, agrotóxicos, metais pesados etc. Tais contaminantes podem causar danos seríssimos que variam desde disfunções do sistema nervoso, fígado e rins, até o envenenamento e alguns tipos de câncer 9.
Ao contrário do que se pensa, vive-se uma aparente ou transitória salubridade. Atentos em demasia ao visível da insalubridade, esquecemo-nos do invisível. E aí, num piscar de olhos tudo muda. A imprevisibilidade que descortina uma catástrofe natural ou uma ação antrópica indesejada não escolhe ideologia, classe social, raça, credo, gênero; a criticidade dos acontecimentos é tamanha que não faz distinção a ninguém. Nem para o fato em si. Nem para os seus desdobramentos posteriores.
Em todas as grandes epidemias da história 10 há sempre um paciente zero, por onde a doença começou. Querendo ou não convivemos uns com os outros, direta ou indiretamente, dependendo da nossa disponibilidade e/ou tolerância social.
Por isso, é bom lembrar que o paciente zero pode estar em qualquer lugar. Pode ser qualquer um. O que viajou para o exterior e trouxe consigo o microrganismo. Ou o que consumiu restos de alimentos jogados por alguém no lixo. Ou o que visitou alguém no corredor de um hospital. Ou... Ou... Ou...
Enfim, é em situações assim que o individualismo escorre... com as águas, com a lama, com as ruínas... Para que o pensamento coletivo possa ressurgir. Como na fábula de Esopo, O RATO E A RATOEIRA 11, “o problema de um é problema de todos”, porque isso é viver em sociedade. Isso significa que todos devam estar cientes do seu papel social e trabalhar em favor de um coletivo construído efetivamente sob princípios de igualdade e de equidade, incluindo a saúde. Seja por instinto natural de sobrevivência ou princípio ético e moral, não importa; querer o bem estar e a salubridade coletiva é uma questão de humanidade.    



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