Já parou para pensar???
Já parou
para pensar???
Por
Alessandra Leles Rocha
Cada dia mais, observando a
contemporaneidade, me convenço de que as opiniões não são tecidas, na maioria
das vezes, por ignorância; mas, por dissonância cognitiva ou por satisfação de
algum interesse impróprio. Haja vista o
embate que vem sendo travado no Congresso Nacional, pela Direita e seus matizes,
e o Executivo, na figura do Ministério da Fazenda.
É sempre importante lembrar que a
historicidade não se resume aos instantes fotográficos; mas, ao filme em si. Dito
isso, olhemos para o Brasil de forma retrospectiva. Bem, depois de 21 anos de Ditadura militar, a redemocratização
nacional teve início em 1985, ainda que a contragosto de diversos segmentos da
sociedade, especialmente, aqueles que foram simpatizantes, apoiadores e/ou executores
do golpe de 1964. Basicamente, indivíduos pertencentes ao espectro político-partidário
de Direita.
Sobre eles pairava uma nuvem de
desconfiança e temor de que o progressismo pudesse interferir na manutenção dos
seus interesses e poderes, no âmbito da República. Acontece que, diante da dinâmica dos
acontecimentos pregressos, ela própria, incluindo os seus elementos mais
radicais e extremistas, foi convencida de que um dos caminhos para a
pavimentação do processo de resgate democrático seria a aceitação de uma Assembleia
Nacional Constituinte.
Assim, ao longo de 18 meses,
entre 1987 e 1988, estabeleceu-se um novo marco jurídico-institucional no país,
com a garantia de direitos e liberdades individuais, a promoção da igualdade de
gênero, a criminalização do racismo e a proibição da tortura. De modo que a
Constituição, promulgada em 05 de outubro de 1988, ficou conhecida como "Constituição
Cidadã", devido à sua ampla garantia de direitos e liberdades
individuais e sociais.
No entanto, ao longo desses 37
anos, em tese, acalmadas as desconfianças e temores pós-ditadura, o sentimento
de insatisfação, por parte de muitos simpatizantes, apoiadores e membros da Direita e seus matizes; sobretudo, os mais radicais e extremistas, reacendeu. Aliás, um recrudescimento significativo depois de assistirem
à ascensão progressista ao poder, no país. Algo que vem, então, motivando um
conjunto de práxis que não só afrontam a Carta Magna de 1988; mas, promovem uma
deterioração às conquistas nela estabelecidas.
Haja vista como ela enfrenta
desafios em sua implementação e efetivação. Direitos como saúde, educação,
moradia e transporte, estão longe de uma garantia plena e igualitária. Há problemas
de financiamento, acesso desigual e falta de regulamentação de algumas normas,
ou seja, o país carece da efetivação de políticas públicas que promovam uma
igualdade cidadã. Aí surge a pergunta que não quer calar: a quem pertence a função
primordial de criar e aprovar leis que regem a sociedade? Bingo! As casas
legislativas federais, ou seja, ao Congresso Nacional.
Portanto, esse é o ponto. Ao longo desses 37 anos, sob a influência de
simpatizantes, apoiadores e membros da Direita e seus matizes; sobretudo, os
mais radicais e extremistas, o Brasil tem presenciado inúmeras tentativas de
asfixia da governabilidade, predominantemente, ao longo dos governos de viés progressista.
É flagrante o modo como os parâmetros estabelecidos constitucionalmente, no que
diz respeito às questões de igualdade, justiça social e direitos humanos, são
afrontados todos os dias.
Nesse contexto, a melhoria das
condições sociais, econômicas e políticas, decorrente de reformas e mudanças
estruturais, enfrenta, constantemente, inúmeras tentativas de boicote e
obstaculização. Como no episódio recente experenciado pelo Ministério da
Fazenda.
De modo que o arraigamento demonstrado
no discurso liderado pelos simpatizantes, apoiadores e membros da Direita e seus matizes, sinaliza um distanciamento
absoluto em relação à busca por propiciar um desenvolvimento mais justo,
igualitário e sustentável, ao país. Então, a culpa do seu descontantemento raivoso não é dos governos
progressistas, nem tampouco, da própria Constituição vigente!
Tamanha
animosidade tem suas raízes na historicidade nacional, no ranço colonial
brasileiro. Não se pode negar que o período colonial deixou marcas profundas,
por aqui, como as desigualdades sociais, a concentração de terras, os padrões
culturais, o enviesamento desproporcional na organização da sociedade e uma
relação de dependência com o exterior. Questões que, portanto, resistem e persistem
na sociedade brasileira contemporânea.
Assim, um dos aspectos mais
relevantes para reflexão, se apresenta pela hierarquização social, durante o
Brasil Colônia, a qual estabelece uma divisão baseada em critérios raciais e
econômicos. No topo, proprietários de terra (latifundiários), comerciantes e
burocratas portugueses, que controlavam a economia e a política.
Abaixo deles, havia uma camada
intermediária composta por homens livres, muitos deles mestiços, que exerciam
atividades como pequenos comércios e ofícios, e atuavam como soldados na defesa
da colônia. Por fim, na base da pirâmide social, encontravam-se os indígenas e
os africanos escravizados, que eram a força de trabalho principal e sujeitos às
condições de vida extremamente precárias.
De modo que a tal elite agrária representa
a ancestralidade, hoje, manifesta pelos elementos da Direita e seus matizes.
Daí a perpetuação do discurso colonial, visto que os detentores do poder
econômico e político permanecem inseridos na mesma linhagem histórica. Portanto,
não se permita esquecer que “A história é um profeta com o olhar voltado
para trás: pelo que foi, e contra o que foi, anuncia o que será” (Eduardo
Galeano - escritor e jornalista uruguaio).