Procura-se: Gente que gosta de gente.
Procura-se:
Gente que gosta de gente.
Por
Alessandra Leles Rocha
As correntes que
movem a vida não puxam para um lado só. Que bom que seja assim! É por isso, que
em meio ao caos, a desolação, há sempre um fiapo de esperança a emergir pelo
desembaraço de alguém, que abdica do comodismo, da inércia indiferente, e toma
as rédeas dos acontecimentos pelas mãos.
Coisa rara de se
ver?! Sim. Gente que gosta de gente nesse nível, de fato não se encontra em
toda esquina. Um dia, sem mais nem porquê, aparece para cumprir seu papel
fundamental na odisseia humana. Arregaça as mangas, respira fundo e vai mesmo
sem saber aonde tudo isso vai dar.
Além de
surpreendente, ver esse processo acontecer é profundamente fascinante. Afinal,
é preciso coragem. Uma coragem que ultrapassa qualquer razão, qualquer
instinto. Uma coragem que pulsa ao ritmo do próprio coração. Que sabe melhor do
que ninguém quantos desafios lhe esperam. Quase sempre os meios são escassos. Quase
sempre a ajuda é pouca. Quase sempre as portas estão fechadas. Quase sempre...
Mas a urgência...
A linha que divide os
afortunados dos desafortunados é desigual. As carências humanas assombram pela
dimensão; embora, pudessem ser mitigadas por gestos simples de generosidade, de
fraternidade, de compaixão. Mas, em um mundo onde os direitos são compreendidos
como privilégios, tal entendimento parece se tornar inatingível. Aí, o que era carência
transforma-se em mazela. Cronificada, perene. Capaz de arrebanhar cada vez mais
seres humanos, como um deserto em expansão.
Por isso a relevância
dos nobres abnegados. Em uma terra marcada pela cegueira da alma, gente capaz
de enxergar o visível e além dele é uma benção. Talvez, o próprio milagre. Guiados
pelo cajado da empatia, lá vão eles semear esperança e oportunidade por
caminhos tão castigados pelo esquecimento, pela invisibilidade. Totalmente despreocupados
em bradar discursos vãos. Para eles cada minuto é precioso, cada minuto vale o
sopro de vida de quem precisa do seu afago, então, não há tempo a perder. É preciso
agir.
Não é à toa que em períodos
tão perversos e cruéis, que vez por outra se debruçam sobre a humanidade, a
reflexão é posta à prova novamente. Enquanto uns e outros se digladiam pelos tesouros
do mundo, por ideologias que só discutem maneiras de se viver devotados aos
bens, valores e prazeres materiais, há quem siga despojado de tudo isso, repleto
somente de um amor responsável, efetivamente altruísta. Dotado de uma
capacidade indizível de enxergar no outro a sua própria imagem.
Acima de quaisquer concepções
ou doutrinas religiosas, que estabeleçam a esses indivíduos uma denominação
especial, o mais importante é a percepção de que apesar de todos os pesares do
mundo não estamos sós. Em cada lugar, em cada diminuto pedaço de chão, eis as
mãos estendidas, prontas para professar o bem na sua forma mais genuína.
Dizia São Francisco
de Assis 1 que “ninguém
é suficientemente perfeito, que não possa aprender com o outro e, ninguém é totalmente
estruído de valores que não possa ensinar algo ao seu irmão”. E comungando desse entendimento tantos outros
fizeram e seguem fazendo em favor de um mundo melhor. Madre Teresa de Calcutá 2, Irmã
Dulce 3, Médicos sem Fronteiras 4, Fraternidade sem Fronteiras 5, Cruz Vermelha 6
são apenas alguns exemplos.
Por isso, jamais
nos esqueçamos de que “dentro de nós há
uma coisa que não tem nome, essa coisa é o que somos” 7.
O que significa dizer, nos atentarmos em olhar além da casca, descobrir no
interior do mais profundo limite existencial a verdadeira essência, aquela que
é a única capaz de medir o nosso grau de humanidade.
Temos nos deixado
influenciar, perder, deteriorar entre os apelos e os enganos do mundo,
lustrando o exterior com esmero como se isso nos bastasse. As futilidades e as frivolidades
nos criam falsas belezas, falsas expectativas; enquanto, o mundo espera por
nós, por mais de nós.
Isso não representa
uma convocação geral para nos alistarmos na legião dos abnegados; afinal, como
disse anteriormente, “Gente que gosta de gente nesse nível, de fato não se
encontra em toda esquina”. Mas, uma convocação para buscarmos ser um pouco melhores.
Qualquer bocadinho, em termos de empatia, já faria muito bem para esse mundo,
não é mesmo?!