Negar...


Negar...




Por Alessandra Leles Rocha




Então é assim, vai ser na base do negacionismo pleno e irrestrito?! Nega Ciência. Nega a Democracia. Nega o pluralismo de ideias. Nega a cidadania. Nega a liberdade de expressão. Nega... Mas, de que adianta? Lamento, mas essa pergunta precisa ser respondida.
Não sabe como responder ou não tem como? É; a segunda opção venceu. Até Cristo foi negado três vezes por mais difícil que seja acreditar, não é mesmo?! O mundo, meus caros, não é o reflexo harmônico da perfeição. Porque na verdade, o que seria a perfeição senão uma perspectiva particular, um ponto de vista. E ninguém pensa igual. Ninguém vive igual. Ninguém gosta igual. Por mais que creia estar totalmente integrado ao sistema, ao bando.
Por um minuto pare e imagine tudo de uma única cor. Você comendo todos os dias a mesma coisa. Você lendo todos os dias as mesmas informações. ... Será que isso é realmente possível? Tolerável? Basta um pouco de ar nos pulmões e sangue correndo lentamente pelas veias para responder com segurança que não. Ser humano se baseia na escolha, na aspiração, no querer. Cada dia quando abrem os olhos a percepção é inevitavelmente diferente. Bons humores. Maus humores. Sorrisos. Caretas. Enfim...
Então, que história é essa de impor silêncio as vozes alheias?! Negar a fala, o discurso alheio?! A diversidade, embora expresse a discordância, não fez e não faz apologia à intolerância e, nem tampouco, à violência ou a guerra. Olhe para o mundo e perceba a diversidade convivendo numa boa. Não há briga entre as flores. Não há agressões entre as árvores. Não há pássaros cantando mais alto para abafar o canto do outro. Cada um reconhece seu espaço. Cada um tem a dimensão do seu papel, da sua importância e, sobretudo, da sua responsabilidade.
Quem teima em agir na contramão desse entendimento é o próprio ser humano. Egocêntrico. Vaidoso. Mimado. Inconsequente. Que perde um tempo enorme procurando “pelos em ovos” ao invés de se concentrar na essência factual da vida.
Olhando para o agora, acredito com mais convicção de que o silêncio não cala, mas grita em alto e bom tom. Infelizmente, ele ressalta a imagem e elas dizem mais e melhor do que quaisquer palavras. São as imagens que nos contam a história; como ela é. Sem retoques, sem lados. Apenas fatos nus e crus a serem digeridos e interpretados privativamente.
São covas abertas aos milhares nos cemitérios. Cortejos fúnebres solitários. Hospitais superlotados. Profissionais de saúde totalmente esgotados. Transporte público lotado. Filas pelas cidades. Carreatas em favor da retomada econômica. Manifestações contra a Democracia. Milhares de imagens que dispensam palavras para reverberar o seu discurso, seja ele de ódio ou de amor.
Portanto, o negacionismo não cabe nesse contexto porque ele se contradiz. A linguagem ela não é só verbal.  Talvez, sua força maior esteja justamente no não verbal. Palavras podem nos faltar. Ideias podem não traduzir a expressão inteira. Mas, o não verbal é sempre completo, pleno da sua inteireza. Símbolos, signos, imagens, vídeos. Não se esqueça de que o cinema quando começou era mudo e, nem por isso deixava de lotar as sessões.
Além disso, negar não muda as opiniões, as tendências, as orientações. Pode-se até criar um “politicamente correto”, dentro de determinados padrões e valores; mas, ele vai ser sempre de uma superficialidade absurda, porque não vai refletir o cerne do indivíduo. De modo que isso tende a criar um movimento existencial caricato e negacionista da própria verdade individual.
O negar, portanto, não faz outra coisa senão tentar, de todas as formas, massificar para impor o totalitarismo. Afinal, a massa deixa de ter as identidades individuais preservadas para adquirir uma identidade coletiva e pré-determinada a serviço de alguém ou algum interesse. Como se evidencia no poema de Lord Tennysson, A Carga da Brigada Ligeira (1854), “[...] Para a frente a Brigada Ligeira! havia algum homem desanimado? / Todavia, o soldado não sabia / De algum modo que tivesse disparatado. / Eles não têm de responder, / eles não têm de se perguntar, / eles só têm de fazer e de morrer. / Para o vale da Morte / cavalgaram os seiscentos”[...].   
Diante dessa reflexão é possível entender que negar pode até ser útil; mas, não é válido e muito menos resolutivo. O negar apenas retarda, mas não coloca um ponto final em nada. No fim das contas, negar é só um caminho torto para desconstruir a liberdade esteja ela em cada sentido ou projeção humana.


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