Quando é que vamos perceber que a humanidade está adoecendo???

Quando é que vamos perceber que a humanidade está adoecendo???

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

A Revolução Industrial, na segunda metade do século XVIII, impulsionou uma nova perspectiva social para a raça humana, o consumo. Para produzir em larga escala era fundamental que houvesse demanda. Então, da consciência em torno do óbvio emergiram milhares de teorias e técnicas suficientemente capazes de envolver e persuadir as pessoas a se integrarem totalmente no ciclo de produção e consumo.

Ora, isso foi decisivo, do ponto de vista do inconsciente coletivo, para dar forma a uma personalidade cada vez mais materialista ao longo dos séculos. Da lógica de um produzir suficientemente capaz de gerar recursos para o consumo, o ser humano foi se afastando de uma consciência sobre o que é realmente importante, essencial, para satisfazê-lo em suas necessidades mais simples ou complexas.

O mais estranho nesse movimento foi a inexistência de quaisquer questionamentos a respeito dos impactos e desdobramentos decorrentes da Revolução Industrial. Uma das explicações está no fato de que a própria arbitrariedade do poder capital silenciou a capacidade crítico-reflexiva das pessoas, através de um conjunto de narrativas inebriantes em torno do potencial da inovação que emergia e o acúmulo de tarefas e obrigações intermináveis. De modo que enredadas pelo novo, elas não se deram conta do que tudo isso representaria mais adiante.

Assim, excetuando-se as elites e os governos, detentores dos meios de produção, o restante da população se viu na condição de passar a trabalhar cada vez mais; mas, nem sempre, em condições e salários efetivamente satisfatórios para garantir a sua dignidade humana. E sem quaisquer coincidências ou acasos, eis que a partir desse contexto, a humanidade embarcou numa cruzada de adoecimento físico e mental bastante significativa.

É curioso que, apesar da melhoria na expectativa de vida de milhões de seres humanos, a fragilização da saúde permaneça figurando no planeta em decorrência de diferentes fatores. Algo elementar, caro (a) leitor (a)! O acirramento das desigualdades impõe esse desafio. Nem todos têm acesso aos serviços básicos de saúde ou dos avanços científicos e tecnológicos nesse setor, ou a alguma atividade física regular e assistida por um profissional, ou ao lazer e entretenimento, ou à segurança alimentar, ou a condições de moradia adequadas e salubres, enfim.

Não pense que isso é especulação da minha parte! Basta ver os índices de expectativa de vida para descobrir que dentro de uma mesma cidade, alguns cidadãos vivem mais do que outros, justamente por conta das desigualdades socioeconômicas existentes. Então, quando essa análise ganha a comparação entre estados ou países, a gente percebe como o adoecimento social é um problema real e concreto na contemporaneidade e precisa ser alvo de medidas urgentes.

Matérias como “As doenças desconhecidas que afetam 350 milhões ao redor do mundo” 1, ou “’Perdi todos os movimentos e fiquei 13 dias na UTI’, diz sobrevivente da Guillain-Barré” 2, ou “Estudo mostra por que o câncer de pele cresce e aponta limitações dos filtros solares” 3, por exemplo, deveriam exercer um choque de realidade para que as pessoas se despertassem para o fracasso da frenética dinâmica imposta pela sociedade de consumo.

É preciso entender que a busca pelo ter, não implica necessariamente, na efetividade da mobilidade social. Portanto, levados à exaustão nessa corrida sem fim, a real insuficiência e ineficiência do capital se mostra clara diante do adoecimento populacional. As estratégias de marketing, dizem por aí, que o indivíduo pode comprar de um tudo, só se esquecem de dizer que, quando o assunto é a saúde, a regra não se aplica. Segundo a própria organização Mundial da Saúde (OMS), “As pessoas estão vivendo mais – mas com mais incapacidade”, o que significa que “em grande medida, as doenças e condições de saúde que causam mais mortes são as responsáveis pelo maior número de anos de vida saudáveis perdidos” 4.

Razão pela qual, entre os 17 objetivos de Desenvolvimento Sustentável estabelecidos pela Organização das Nações Unidas (ONU), o terceiro diz respeito à “Assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todas e todos, em todas as idades” 5, até 2030. Considerando que o desenvolvimento sustentável se fundamenta em três dimensões, ou seja, econômica, social e ambiental, a saúde se insere nessa consciência como condição essencial no modo de vida, no trabalho, na habitação, no ambiente, na educação, no lazer, na cultura e no acesso a bens e serviços indispensáveis.

Afinal, como escreveu Jiddu Krishnamurti, filósofo e educador indiano, “Não é sinal de saúde estar bem adaptado a uma sociedade doente”. E o adoecimento global, nos moldes quem têm se apresentado, compromete definitivamente a sobrevivência da espécie humana, porque ele acontece sob diferentes formas; mas, todas elas motivadas principalmente pela desumanização e pela falta de perspectiva para o futuro. Infelizmente, essa perda da saúde pela maioria das pessoas é um reflexo da consciência de que fazer parte da sociedade consumo é, no fundo, uma luta inglória.  

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