Escassez de mão de obra. Desemprego. Etarismo. Saúde Mental. Tudo junto e misturado!
Escassez
de mão de obra. Desemprego. Etarismo. Saúde Mental. Tudo junto e misturado!
Por
Alessandra Leles Rocha
Preocupação global, a saúde
mental está imersa em questões triviais do cotidiano, as quais a maioria da
população nem se dá conta. Foi assistindo a várias matérias recentes sobre as
gigantescas filas dos “feirões de vagas
de emprego”, Brasil afora, e pondo reparo às entrevistas, que pude captar a
sutileza das entrelinhas perversas, pela manifestação de diversos preconceitos
e discriminações, incluindo o etarismo.
A discriminação contra indivíduos
com base em estereótipos associados à idade, sempre esteve presente na
sociedade brasileira. Sobretudo, em relação às mulheres. Acontece que o peso
dessa análise vai muito além da exaltação do envelhecimento em si. Trata-se de
evidenciar a passagem do tempo como uma condição degradante e marginalizante
para a realização de qualquer trabalho fora do contexto doméstico.
É como se a força de trabalho
estivesse resumida à força física, ao vigor, à destreza lógica, tão
frequentemente atribuídos à juventude. Como se a morte estivesse anunciada na
idade presente no documento pessoal, ou seja, o idoso já vive na expectativa de
não ter amanhã, ao contrário do jovem. Como se a aparência juvenil pudesse agregar
mais valor a bens, produtos e serviços. ...
No entanto, considerando que o
mundo caminha para um envelhecimento populacional consistente nas próximas décadas
e que, em paralelo a esse processo, tem havido um empobrecimento das nações, o
modo de olhar e entender a situação precisa ser outro. Particularmente, nos países
classificados como “em desenvolvimento”,
segundo a Organização das Nações Unidas (ONU)1.
Algo que inclui o Brasil.
Diante da inexistência de
políticas públicas formuladas e estruturadas para atender a esse cenário
social, cada vez mais a presença de idosos nas filas de emprego se amplia e dá
a dimensão da fragilidade socioeconômica que envolve suas vidas. Então, não bastassem
os impactos psicoemocionais inerentes ao processo de envelhecimento, o etarismo
surge como mais um desafio para manterem sua saúde mental equilibrada a fim de
alcançar o seu objetivo de sobrevivência.
A disputa no mercado de trabalho
é sim, cada vez mais feroz. São milhões de pessoas em busca de um emprego, ou
de uma recolocação dentro do status formal. Todos ali precisam e dependem daquela
oportunidade para assegurar a dignidade do seu cotidiano. É o pão de cada dia
que está em jogo. É o aluguel. É a luz. É a água. É a vida...
No entanto, sob a alegação numérica
das conjunturas, eis que o etarismo aparece como critério de exclusão na
maioria dos casos, desencadeando um fenômeno de destruição da autoestima e do
aparecimento de um profundo desalento entre as parcelas mais vividas da
população. É nesse ponto que ele se torna o estopim para o comprometimento da
saúde física e mental dessa parcela humana.
O etarismo adoece a população
idosa, na medida em que a faz se sentir desqualificada, inapropriada, incapaz,
ultrapassada, feia, ... E esse adoecimento mental, moral, fomenta um ciclo
vicioso que degrada lentamente o indivíduo, pela somatização das suas tristezas,
dos seus infortúnios, das suas mazelas, e pela potencialização de eventuais
comorbidades preexistentes. Quanto mais o indivíduo é preterido socialmente,
mais a sua qualidade de saúde é comprometida.
Sem contar, que tomados por tanta
depreciação, eles acabam rendidos aos assistencialismos e aos oportunismos de
plantão. Às vezes, lançados as mais atrozes condições de precarização laboral. Sim,
muitos acabam aceitando propostas degradantes em nome de um mínimo de sobrevivência.
Às vezes, submetidos às indignidades que compõem o leque de “auxílios” governamentais, notoriamente
conhecidos pela insuficiência, frente ao que estabelece a própria Constituição
Federal de 1988.
Pois é, nos atemos muito às
doenças; mas, esquecemos de refletir sobre as causas. Muito pouca gente se
pergunta o que estaria por trás de tanta depressão, no mundo? De tanto suicídio?
De tanta frustração? De tanto desalento? E esse não se perguntar, abre as
fronteiras, inclusive do mercado de trabalho, para o fluxo contínuo de agentes
fomentadores dessas situações, como é
o caso dos preconceitos e das discriminações.
Etarismo. Gordofobia. Misoginia e
Sexismo. Homo e Transfobia. Xenofobia. Aporofobia. Racismo. Eles são sim, armas
de destruição humana. Aliás, as violências começam pelas palavras. Porque o
modo como são ditas, recebidas e processadas é sempre imprevisível. De repente,
elas acessam um gatilho de memórias e lembranças profundas que fazem emergir
uma série de desdobramentos devastadores, em fração de segundos.
É sério! Se ninguém conhece a si mesmo,
o que dirá a respeito do outro! Os impactos que causamos nas pessoas, sejam
bons ou ruins, precisam de reflexão, de consciência. E no caso dos
preconceitos, o que se tem é uma aplicação rasa e inconsistente de crenças, valores
e sentimentos, os quais, na maioria das vezes, sequer foram analisados ou
ponderados de maneira particular. Fluem de achismos, de casuísmos, frutos de um
senso comum deturpado.
O importante; sobretudo, na conjuntura
atual, é perceber como esse comportamento tem afetado e prejudicado milhões de
pessoas, no cerne da sua sobrevivência. O quanto a humanidade está ampliando os
desafios relativos à convivência e coexistência social desnecessariamente. Inclusive,
colocando em xeque se, de fato, há realmente uma inexistência, tão expressiva,
de mão de obra qualificada à disposição. Talvez, seja bom refletir a respeito
com todo o respeito que essa questão merece!