Não quero o certo e nem o errado, eu quero ser feliz!
Não
quero o certo e nem o errado, eu quero ser feliz!
Por
Alessandra Leles Rocha
A recente eleição na França
trouxe entre tantas reflexões uma que é bastante importante para o mundo. A
candidata da extrema-direita que fora derrotada no segundo turno das eleições
presidenciais prometeu aos seus eleitores manter sua posição de luta contra o
candidato reeleito 1.
Mas, o que isso tem de especial?
Simplesmente, o fato de que a política global tem se mostrado assim, secularmente
divergindo opiniões e permitindo que esse movimento de rupturas e desagregações
atue, de maneira catastrófica, contra os interesses dos próprios países e
cidadãos.
Se no cotidiano comum da vida
humana já se percebe nitidamente a dificuldade dialógica em se encontrar um
denominador comum, nem queira pensar no campo político! Nesses seletos espaços
da representatividade popular, o que se vê amiúde são atores digladiando seus
egos na defesa de interesses enviesados e, quase sempre, particulares. Mantendo
em chama a alta o velho ideário de que “os
fins justificam os meios”.
O povo, os interesses deste, aparecem
comumente de maneira coadjuvante nos discursos inflamados, tal qual um véu que
mascara aquilo que se esconde mais profundamente, ou seja, as (más) intenções.
É preciso entender que essa
discordância política selvagem não tem, na verdade, nada de normal ou de
natural. Essa história de se fazer oposição a certas ideias ou projetos, tendo
como base única de fundamentação apenas um “sou
contra”, é muito démodé; mas,
particularmente, perversa.
Trata-se de um narcisismo
exacerbado que faz de tudo, o que parte do outro, algo menor, desimportante,
vulgar e contestável. Além de só evidenciar o tamanho do vazio argumentativo de
uma ignorância estúpida.
Ora, pelo menos em tese, seres
humanos podem bem mais do que isso! Cabeça foi feita para pensar! E um mundo
plural, como é o nosso, não pode existir defendendo caminhos únicos, restritos
e limitados.
Pensar grande não é pensar com
vista a privilegiar uns e outros. Pensar grande é pensar coletivamente. É fazer
do pensamento uma materialização da própria evolução, em todas as direções e
sentidos.
Vejam, por exemplo, o cenário da
imunização contra a COVID-19 no mundo. Enquanto correntes entrincheiradas em
suas convicções criam obstáculos para vacinar o maior número de pessoas no
planeta, o vírus está por aí, firme e forte.
Tanto que a China continua
fazendo lockdown para conter o avanço das variantes, apesar de todos os
inconvenientes econômicos que tal medida tem imposto para eles e o resto do
mundo. Recuo dos preços do petróleo. Containers parados nos portos.
Desabastecimento de produtos. Um verdadeiro caos. O mundo patinando sem sair do
lugar.
Basta um minuto de atenção para
perceber que esse comportamento não cabe mais nas necessidades do século XXI. Chega
dessa ideia absurda que coloca a razão como um prêmio a quem consiga provar que
a tem! Ninguém precisa ter razão! Ninguém precisa estar certo o tempo todo!
Porque, para início de conversa,
todos somos seres inacabados. Feitos de um barro que precisa ser modelado e
remodelado, muitas vezes nessa vida, sem que consiga chegar ao patamar ideal.
Somos pura perspectiva, um jeito próprio de olhar e entender a dinâmica do
mundo, porque somos humanamente singulares.
É claro, que diante de tantos
rodopios que a Terra já deu, muita coisa já se estabeleceu como valor, como
princípio, como caminho. Outras tantas fazem parte de algo mais pessoal e
intransferível, que parte da consciência decisória e resolutiva de cada um.
Mas, muito há por se equacionar coletivamente, porque diz respeito aos
interesses humanitários.
E como não somos cópias
xerográficas, cada um é um, somos milhões distribuídos por aí, imbuídos dessa
missão. Em casa. Na rua. No trabalho. Em todo lugar. E, quase sempre, estabelecendo
as conexões necessárias a partir das afinidades, dos pontos em comum que nos
alinhavam as emoções, os sentimentos e as ideias.
Mas, como elas não se apresentam em
100% do tempo, não as ter não tem que impor quaisquer desqualificações ou
impossibilidades para que possamos dialogar e encontrar um ponto comum que seja
no meio do caminho para as partes.
O que passa por uma boa dose de
boa vontade, de disposição, de desapego, de espírito pacifista. Porque quem
quer um mundo melhor, quer que ele seja assim por inteiro, não aos pedaços, aos
farelos, às migalhas.
Então, quando olho para a
política me deparo como uma estrutura que só pode ser definida por um estado de
total debilidade e adoecimento. Afinal, ela se distanciou muito do que entendia
Aristóteles, ou seja, “A política não
deveria ser a arte de dominar, mas sim a arte de fazer justiça”.
Mas, infelizmente, como o tempo
ela se permitiu aliar a outros sistemas de força e poder, a tal ponto que ela “tem sido a arte de obter a paz por meio da
injustiça” (Agostinho Silva –
filósofo e poeta português). Ora, e “A
injustiça num lugar qualquer é uma ameaça à justiça em todo lugar” (Martin
Luther King Jr.).
Portanto, a ideia de fragmentar a
política em facções de gente capaz de só dizer “sou contra”, partindo do pressuposto de que tudo que não parte de
mim ou do meu grupo merece ser rechaçado, está levando a humanidade para um
imenso buraco, proliferando desafios, esbanjando equívocos e enaltecendo
despreparados e incompetentes.
De modo que a defesa arraigada de
certas dicotomias, como “certo e errado”
ou “bom e mau”, ergue muralhas
intransponíveis para a evolução e o desenvolvimento social. Não se pode exagerar a vida no absolutismo
das questões, na demonização disso ou daquilo, porque ela se faz sob eterna
relativização. Tudo depende das conjunturas, dos cenários, dos impactos, dos
atores, do tempo.
Mais do que nunca, a
contemporaneidade é só um palco de incertezas, razão pela qual tudo precisa ser
medido, pesado e analisado sob a ótica histórica e criticamente reflexiva.
Por isso, convido você leitor (a)
a não perder as oportunidades de pensar com equilíbrio e profundidade; mas,
também, de compartilhar comigo a sabedoria do poeta Ferreira Gullar, quando escreveu:
“Não quero saber do sofrimento, quero é
felicidade. Não gosto de fazer lamúrias. Uma vez, discuti feio sobre
determinada situação. Fiquei sozinho em casa, cheio de razão e triste pra
cacete. Então, pra que querer ter razão? Não quero ter razão. Quero é ser
feliz! ”.