Boletim Escolar – Aprovados ou não?!
Boletim
Escolar – Aprovados ou não?!
Por
Alessandra Leles Rocha
Fala-se muito em
educação; mas, uma situação que me incomoda muito é o desinteresse social em
relação ao que é, de fato, importante para a qualidade do processo de
ensino-aprendizagem no país.
Em pleno século
XXI, a sociedade brasileira ainda entende o desempenho escolar, por exemplo,
pelas notas no boletim emitido pela escola. Mas, notas baseadas em quê? Se a
qualidade do que é oferecido está aquém do que poderia ser, as notas irão refletir
os parâmetros dentro dessas condições, ou seja, niveladas para baixo. Portanto,
os boletins espelham um enviesamento da realidade.
Isso, sem contar,
que muitos pais e responsáveis se satisfazem com resultados dentro da média de
aprovação escolar, 50 ou 60%. De modo que aquilo que já estava abaixo passa a
refletir algo ainda menor. A ideia de conseguir passar de ano é satisfeita;
mas, em momento algum, a sociedade questiona o real aprendizado necessário para
avançar de um nível para outro ou para cumprir as demandas futuras da vida daquele
aluno.
Mas, o que dizer,
então, se estivéssemos buscando o Boletim Escolar do país?! De repente nos
deparamos com o resultado expresso, hoje, pela Avaliação do Pisa (Programa
Internacional de Avaliação de Alunos) 1.
Há uma “estagnação” desde 2009, o Brasil ocupa agora a 42º posição no ranking de avaliação em leitura, 58º em
matemática e 53º em ciências. No entanto, o pior é descobrir que 43% do total
de alunos participantes da prova não alcançaram o nível considerado mínimo em
nenhuma das áreas avaliadas 2. Com
esse “boletim” pode-se dizer que o país não foi aprovado. As reflexões a
respeito são, portanto, inevitáveis.
Observando o frisson que permeia as discussões em
torno do uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) nas escolas, percebo
que ao contrário de ser um meio tornaram-se um fim para a Educação. E como um
fim, não parece estar conseguindo transformar os pífios resultados apresentados
pelas avaliações de ensino-aprendizagem.
Ora, é simples
entender. Embora os materiais didáticos disponíveis atualmente - o que inclui
as TICs - apresentem uma grande
evolução em termos de qualidade, de design,
de inovação, de opções de custo etc., o planejamento da sua utilização é a
grande chave na construção da qualidade educacional.
Ao escolher um
recurso, uma ferramenta, um material didático que seja; é essencial saber quais
objetivos pretende se alcançar, quais expectativas de resultado se tem em
mente, qual o nível de interesse e participação dos alunos em relação à
proposta pedagógica apresentada, enfim... Não basta ter esses materiais acessíveis,
disponíveis em todas as escolas se os docentes não souberem exatamente como,
quando e por que utilizá-los.
Nem sempre uma aula
“high tech” vai resultar em uma
aprendizagem efetiva para os alunos. Mesmo porque, essa geração já nasceu sob o
signo da tecnologia, tem ao alcance das mãos milhares de informações na
velocidade da luz e domina a utilização de recursos tecnológicos com muito mais
facilidade, na maioria das vezes, do que os seus próprios professores.
Então, o ponto chave
está na consolidação do seu letramento, em como eles constroem um aprendizado
crítico e reflexivo sobre esse volume descomunal de conhecimentos.
Isso significa
aproveitar todas as formas de produção e circulação da informação e do
conhecimento – MULTILETRAMENTOS, de modo que a MULTIMODALIDADE irá requerer
outras habilidades e competências de leitura, interpretação e comunicação, e a
necessidade da capacidade crítica se fortalecerá como ferramenta para interação
na sociedade.
E isso cabe, também,
em relação às viagens e passeios extraclasses. Tão comuns e já lançados
previamente nos calendários escolares por todo o país, os mesmos não
correspondem na prática ao enriquecimento da aprendizagem dos alunos.
É tanta euforia, tanta
dispersão, tanta carência de uma proposta de atividades para identificar e mensurar
esse aprendizado, que o processo culmina por se tornar mais produtivo do ponto
de vista da socialização do que, na verdade, do ensino-aprendizagem sobre um determinado
conteúdo.
Mas, mergulhando
ainda mais profundo nesse universo não se pode esquecer de que o país, ainda,
convive com milhares de linhas abissais de desigualdade educacional. Escola pública.
Escola particular. Escola de periferia. Escola de centro de cidade. Escola de Ensino
Fundamental. Escola de Ensino Fundamental e Médio... São tantas as variáveis se
intercruzando, que a Educação não flui no mesmo ritmo, na mesma linearidade, no
mesmo propósito. No fundo, o que une todas elas é dispor de um calendário com
200 dias letivos.
Mas, para torná-los
eficientes e produtivos se faz necessário, com urgência, repensar os
planejamentos em todos os níveis. Um Plano Político
Pedagógico anual e específico para cada escola; mas, que seja capaz, sobretudo,
de oferecer propostas didático-pedagógicas alinhadas as demandas do país. O ensino-aprendizagem é um processo que se sustenta na interação humana, no contexto social, no diálogo, na argumentação, na produção de significados e significâncias.
Assim, alunos e
professores precisam “colocar a mão na massa” conjuntamente, em parceria, para
que os resultados possam ser percebidos além dos boletins, ou seja, na prática
cotidiana. Aquilo que o indivíduo constrói por ele mesmo não se destrói pelo
tempo. Fica impresso. Fica armazenado na memória. Porque faz sentido.
Ciência de que os
caminhos percorridos até agora não satisfazem as expectativas já se tem. A etapa
seguinte, então, é alterar os mapas. Expertise
para isso não falta; talvez, um pouco de boa vontade e de entusiasmo. Quanto aos
recursos disponíveis, empregá-los com mais racionalidade, com mais objetividade
também é muito importante. Mas, se não houver uma compreensão exata de que essa
é uma necessidade que ultrapassa os limites da escola, de nada adiantarão os aspectos
anteriores.
Pensar sobre isso. Discutir
sobre isso. Propor ideias. É tarefa para a sociedade como um todo. Afinal de
contas, sem educação o país não avança em relação a nenhum projeto de
desenvolvimento. Sem educação o país não rompe as velhas amarras da subserviência
colonial.
Não adianta que uns
e outros possam pagar caro pela Educação dentro ou fora do país. O que move as
engrenagens da nação é um contingente muito maior, que extrapola em muito o
limite dos privilegiados. Por isso, “a educação exige os maiores cuidados,
porque influi sobe toda a vida” 3; sobre toda a dinâmica social seja para as gerações atuais, seja para as futuras.
1
É
uma avaliação internacional que mede o nível educacional de jovens de 15 anos
por meio de provas de Leitura, Matemática e Ciências. O exame é
realizado a cada três anos pela OCDE (Organização para Cooperação e
Desenvolvimento Econômico), entidade formada por governos de 30 países que têm como princípios
a democracia e a economia de mercado. Países não membros da OCDE também podem
participar do Pisa, como é o caso do Brasil, convidado pela terceira vez
consecutiva. O objetivo principal do Pisa é produzir indicadores que
contribuam, dentro e fora dos países participantes, para a discussão da
qualidade da educação básica e que possam subsidiar políticas nacionais de
melhoria da educação. (Fonte: http://portal.inep.gov.br/artigo/-/asset_publisher/B4AQV9zFY7Bv/content/o-que-e-o-pisa/21206)
3 Lucius Annaeus Sêneca foi um dos
mais célebres filósofos, escritores e intelectuais do Império Romano. https://www.ebiografia.com/seneca/