"Tudo é incerto neste mundo hediondo, mas não o amor de uma mãe". James Joyce (escritor irlandês)
Amanhã
é Dia das Mães...
Por
Alessandra Leles Rocha
Incomoda-me olhar
ao redor e verificar cotidianamente a construção de um movimento de
mercantilização da vida. Sim, cada dia mais é como se estivéssemos tecendo
relações humanas dentro de parâmetros de “vale quanto pesa”, enquanto se
esgarçam a afetividade, a cumplicidade, o companheirismo,... o amor.
Amanhã é Dia das
Mães. Mas, será que faz algum sentido real eleger entre as datas do calendário
uma única para celebrar alguém tão importante? Automatizados pela trivialização
do dia a dia, muitos de nós, talvez, se abstêm de pensar a respeito, embora não
devessem. Já dizia Rubem Alves, “aquilo
que está escrito no coração não necessita de agendas, porque a gente não
esquece. O que a memória ama fica eterno”.
E quão impactante é
essa afirmação. Embora na vida sempre haja uma exceção, a regra nos mostra que
a relação mãe e filho é algo muito sério, muito significativo, porque se baseia
na fiação mais sublime do amor. Gestar um ser vai muito além de proteger,
resguardar e nutrir outro ser em desenvolvimento. Gestar é realizar a mais
complexa metamorfose existencial, quando uma mulher deixa para trás a sua existência
primária para assumir outro papel na teia da vida. E o que move esse processo
incondicionalmente, pelo menos em tese, é a capacidade de amar.
Parte de si mesma,
o filho é para a mãe um misto de presente e desafio. Uma responsabilidade indescritível
e que, muitas vezes, não pode ser compartilhada com ninguém; visto que, essa é
uma relação que nasce antes mesmo do próprio nascimento. No toque que não toca,
mas sente o movimento do bebê. Na conversa silenciosa com a barriga que cresce.
Na preparação gradual para o encontro. Na perspectiva do amanhã.
Todo o narcisismo
existencial da mulher vai gradativamente se diluindo para ceder espaço a outro
pedaço, outro ser. A maternidade é um divisor de águas, uma cortina que se abre
para enxergar o mundo como de fato ele é, nas suas incongruências, na sua
diversidade, nos seus perigos, nos seus obstáculos... Então, a mãe sabe que
nada será como antes, quando aquele pequeno ser abrir os olhos pela primeira
vez.
A partir desse
momento, ambos estarão trilhando juntos a mesma estrada. Estarão compartilhando
as aventuras e as desventuras do mundo. Compatibilizando as diferenças de suas
singularidades. Discutindo a relação na infinitude de seus pontos de vista em
formação. Aprendendo e ensinando. Amando... Mais e mais a cada dia.
Porque amar é isso.
É não se limitar pelos nossos próprios limites. Nem sempre concordaremos. Nem sempre
estaremos de bom humor. Nem sempre acertaremos. Nem sempre conseguiremos
realizar. Nem sempre... Mas, isso não nos impossibilita de resguardar o que há de
mais profundo em nós que é o amor nosso de cada dia.
Para presentearmos,
então, não precisamos de dia fixo. Dia das Mães, dos pais, dos avós, dos irmãos,
dos amigos, dos amores etc., nesse contexto mercantilizado, pode ser qualquer
um. O importante é que essas pessoas figurem protagonizando conosco os melhores
momentos da vida. Dias e noites para não se esquecer, jamais. Que nos façam lembrar
cheiros, sabores, músicas, lugares, Sol, Chuva, Arco-Íris, Lua,...
Lembrar-se da mãe,
uma vez por ano, só por protocolo; quanta insensibilidade! Citando, mais uma
vez, a sabedoria especial de Rubem Alves, “Amor
é estado de graça e com amor não se paga. Nada mais falso do que o ditado
popular que afirma que ‘amor com amor se paga’. O amor não é regido pela lógica
das trocas comerciais. Nada te devo. Nada me deves. Como a rosa que floresce
porque floresce, eu te amo porque te amo”. Não é porque o seu cordão umbilical
foi cortado que esse amor, também, se rompeu e você precisa seguir em frente
obstinado, sem olhar para trás. A pressa, o ceticismo, o materialismo,... nada
do que permeia a contemporaneidade pode justificar a nossa falta de perceber,
de enxergar, de cuidar, de amar o outro sempre; especialmente, a nossa mãe.