Uma breve linha do tempo ...
Uma breve
linha do tempo ...
Por Alessandra
Leles Rocha
Na vida, certos acontecimentos se
mostram muito mais profundos do que aparentam ser. As discussões em torno dos
recentes atos de golpismo de Estado, no Brasil, apresentam tantas camadas, que
acaba por ser inevitável enxergar a sua total dimensão.
Pensando a respeito e observando as
oscilações do dólar, segundo os humores do mercado financeiro, comecei a
estabelecer uma linha do tempo dos acontecimentos, bastante
interessante. Afinal, como é fácil constatar, o frame presente não faz jus à
história em si!
Vejam. A gestão federal, entre
2019 e 2022, fragmentou as estruturas de governo sob o pretexto da
transformação sem, no entanto, trazer quaisquer propostas substitutivas. Foi,
simplesmente, estabelecer obstáculos para a gestão do que estava funcionando.
Mas, por quê? Esse tipo de
pensamento já se mostrava um tipo de plano alternativo, caso o projeto de
reeleição não lograsse êxito. Sim, porque aquele que assumisse o país, a partir
de um cenário, praticamente, de “terra arrasada”, não conseguiria
colocar em prática a sua plataforma de governo e se tornaria alvo de críticas e
cobranças dos eleitores. Um contexto que favoreceria imensamente uma eventual
retomada da Direita e seus matizes, nas eleições de 2026.
Entretanto, não para por aí. No campo
econômico, a escolha do Presidente do Banco Central foi feita a dedo. Ora, fosse
a reeleição bem sucedida, ter uma figura simpatizante e aliada aos interesses
direitistas demonstrava uma boa estratégia.
Mas, em caso de não reeleição,
haveria uma infinidade de possibilidades capazes de construir obstáculos, os
quais minariam, de forma contundente, as perspectivas de sucesso do projeto de
gestão progressista, para o país.
Dito isso, basta uma
recapitulação das matérias publicadas pelo mais amplo espectro nacional e internacional
de mídia, para se deparar com o árduo trabalho do Presidente do Banco Central,
que agora se despede, para descredibilizar e implantar um cenário nacional de
instabilidade econômica para o mercado financeiro global. Isso, sem contar, a
política perversa de juros e a inação do Banco central (BC) diante da
ocorrência dos episódios de elevação do dólar.
Isso significa que, em todo esse
recorte temporal, uma construção dialógica especulativa vem pairando sobre a
política econômica nacional. Com o objetivo de deteriorar a gestão vigente e
abrir espaços para uma campanha depreciativa, junto à opinião pública, a fim de
favorecer o retorno da Direita e seus matizes, nas eleições de 2026.
Aliás, vale lembrar que, ao se
falar em mercado financeiro, ele é constituído justamente por indivíduos pertencentes
ou simpatizantes do espectro político-partidário de Direita. Portanto, todo o
tensionamento e instabilidade que seus comportamentos desencadeiam na economia
tem sim, um propósito muito bem definido aos seus interesses de poder.
Mas, não se engane ao pensar que
tudo isso é privilégio brasileiro! Porque não é. Como já devem ter ouvido, o
movimento expansionista da ultradireita, em todo o mundo, tem buscado minar os
projetos progressistas de governança, a partir desse mesmo modus operandi.
De certa forma, o que eles buscam
não difere, em praticamente nada, das bases ideológicas que sustentaram o
Colonialismo, entre os séculos XVI e XIX. Além do poder político em si, essas
pessoas buscam se reapropriar de outras formas de poder, ou seja, econômico,
social, cultural, religioso, para exercerem as suas práxis de dominação e
controle.
Daí a precarização da economia e
do trabalho ser tão importante aos seus objetivos, na medida em que ela recrudesce
a obstaculização das pretensões de ascensão e de mobilidade social. Em linhas
gerais, isso representa a reafirmação das desigualdades socioeconômicas
concomitantemente à ampliação dos interesses das elites dominantes.
Algo que se explica, por exemplo,
pela manifestação de comportamentos racistas, aporofóbicos, xenofóbicos, misóginos,
... dentro de contextos, cada vez mais, constituídos por fundamentos
necropolíticos. Portanto, um claro
contraponto à visão progressista de governança.
E assim, de repente, somos
capazes de perceber a tecitura dos processos golpistas. Ao contrário do que
muitos acreditam, tudo começa pela corrosão da estabilidade, da capacidade de
gestão e da materialização das plataformas de governo. Há uma flagrante utilização da depreciação discursiva,
por parte das instituições em parceria com os veículos de comunicação e de
informação, para criar um movimento de oposição por parte da opinião pública.
Como bem escreveu Steven
Levitsky, “Os cidadãos muitas vezes demoram a compreender que sua democracia
está sendo desmantelada – mesmo que isso esteja acontecendo bem debaixo do seu
nariz” (Como as democracias morrem, 2018). Acontece que essa demora pode
custar caro.
Portanto, lembre-se do que dizia o filósofo Platão, “... Cada um de nós é como um homem que vê as coisas em um sonho e acredita conhecê-las perfeitamente, e então desperta para descobrir que não sabe nada ...!”. Não é à toa, que seja tão fundamental abrir os olhos e a mente, para dedicar-se a uma análise crítico-reflexiva dos acontecimentos contemporâneos que nos cercam.