Qual é a Democracia que desejamos para o futuro da humanidade?

 

Qual é a Democracia que desejamos para o futuro da humanidade? 

 

Por Alessandra Leles Rocha

 

Fim de linha para o modelo social contemporâneo? Ao que tudo indica, sim. Não há possibilidade de se manter em cima do muro; sobretudo, quando o assunto é a Democracia. E isso não significa que alguém irá cobrar por um posicionamento a respeito. Na verdade, é no silêncio da consciência de cada indivíduo que as conjunturas se propuseram ressoar para a manifestação de uma escolha.

Enquanto, um empresário multimilionário, naturalizado norte-americano, pretende distribuir milhões de dólares por votos ao partido Republicano 1, nas eleições à Presidência dos EUA, em novembro, José Mujica, ex-Presidente do Uruguai, conhecido mundialmente por seu estilo de vida simples e suas ideias progressistas, fez, talvez, seu último discurso durante um comício do candidato uruguaio 2, no último sábado.

Duas figuras diametralmente opostas, cujas recentes manifestações públicas nos impõem uma das mais importantes reflexões contemporâneas, ou seja, qual é a Democracia que desejamos para o futuro da humanidade? Pode ser que uns e outros, por aí, considerem essa pergunta complexa ou difícil de responder, pelo quão desafiadora ela é, no sentido de nos confrontar com nossos mais profundos valores, crenças, princípios, emoções e sentimentos.

Algo que inevitavelmente abre um leque de ponderações entre o TER e o SER, sob perspectivas diversas. Porque o TER transita pela materialidade capital da aquisição e da manutenção da Democracia, abdicando da liberdade de escolha que é o primeiro passo da construção democrática.

Já o SER, representa a genuína apropriação do caráter democrático pelo indivíduo, incapaz de se render a quaisquer apelos materialistas para existir. Há uma clareza indiscutível no ser democrático, porque ele é, ele não está. Ele não depende de nada além da própria consciência.

De modo que esse panorama nos provoca quanto à nossa resistência em não ceder às conveniências imediatistas, aos apelos ilusórios, aos efeitos manada do mundo. O que se espera é uma consciência do papel social da Democracia, verdadeiramente plena.

Ao contrário de uma mera interpretação pessoal e enviesada. Porque isso, caro (a) leitor (a) não só não é Democracia, como abre precedentes perigosos em relação a outras questões importantes para o equilíbrio da convivência e da coexistência social.

A defesa da Democracia pede uma convicção absoluta sobre o que ela realmente significa, ou seja, um sistema político pautado pelo respeito aos princípios que regem a liberdade humana, baseando-se em uma governança majoritária; mas, ao mesmo tempo, observando o equilíbrio em relação aos direitos individuais e minoritários.

Pois é, a Democracia não se orienta pelo individualismo, pelo egoísmo, pelo narcisismo, tão comuns na contemporaneidade. Ela tem um olhar social coletivo, plural, multifacetado. O que explica porque a Democracia é tão desafiadora.

Ora, equilibrar as diferenças em busca de um denominador comum, não é tarefa para qualquer indivíduo. A Democracia pede uma disposição dialógica incomensurável, um exercício argumentativo aguerrido, uma capacidade de negociar inimaginável. E tudo isso é sim, bastante desafiador, para certas personalidades humanas.

Reconhecer que há limites, que há pontos de vista diferentes, que há necessidade de observância das realidades, ... não deveria ser; mas, acaba se tornando um gigantesco obstáculo para a Democracia. Especialmente, quando o contexto contemporâneo tem buscado legitimar o arraigamento das posições, das escolhas, das decisões.

Daqui e dali criam-se polos de divergência, tentando sobrepor ideias e opiniões a qualquer preço. Fazendo com que a Democracia esteja constantemente sob ataque nas trincheiras de conflitos e guerras, na medida em que a ideologia antidemocrática se utiliza de crises econômicas, desastres naturais e, sobretudo, ameaças à segurança.  

Por essas e por outras, é que os dois exemplo citados acima, do empresário multimilionário e do ex-Presidente do Uruguai, tornam-se verdadeiras provocações ao senso democrático contemporâneo. Na materialidade de suas biografias, de suas atitudes e comportamentos, cada um nos permite traçar uma análise crítica e reflexiva sobre os nossos próprios parâmetros democráticos.  

Qual deles está mais próximo ou distante de nós? É, um exercício bastante revelador! Mas, como dizia o escritor e poeta gaúcho, Mario Quintana, “Democracia é oportunizar a todos o mesmo ponto de partida. Quanto ao ponto de chegada, depende de cada um”. Afinal de contas, “A democracia é atividade criadora dos cidadãos e aparece em sua essência quando existe igualdade, liberdade e participação” (Marilena Chauí).